28/02/2021
Uma breve história de Jesus (Helen K. Bond)
27/02/2021
Por que os romanos mataram Jesus? (Geza Vermes)
26/02/2021
O Jesus Histórico (John Dominic Crossan) - Parte 2
20/02/2021
Quando não havia diferença entre judaísmo e cristianismo (James D. G. Dunn)
Nota: trecho retirado do livro Christianity in the Making, Volume 3: Neither Jew Nor Greek, de James D. G. Dunn, pp. 598-600.
Devemos evitar o pensamento de 'judaísmo' e 'cristianismo' nos primeiros dois séculos da era comum como sendo entidades já definidas e claramente distinguidas uma da outra. (...)
É muito problemático usar o termo "cristianismo" para o que estava acontecendo no primeiro século, pois a palavra não aparece até o início do segundo século, quando foi cunhada pela primeira vez, até onde podemos dizer, por Inácio de Antioquia. Falando linguisticamente, 'cristianismo' ainda não existia no primeiro século! — embora, é claro, o termo fosse um desenvolvimento natural do fato de que os crentes em Jesus o Cristo já estavam sendo chamados de 'cristãos' havia algum tempo (Atos 11:26). No Livro dos Atos dos Apóstolos, o movimento dos seguidores de Jesus é referido como uma "seita" (Atos 24:14; 28:22), "a seita dos nazarenos" (24:5). Significativamente, este é o termo que Atos também usa, assim como o historiador judeu Josefo, para as "seitas" dos saduceus, fariseus e essênios (Atos 5:17; 15:5; 26:5). Em outras palavras, Atos considerava o movimento inicial inspirado por Jesus como uma das seitas ou facções que constituíam e eram parte do judaísmo tardio do segundo templo.
18/02/2021
As várias faces de Jesus
Nota: trecho retirado do artigo "A busca pelas palavras e atos de Jesus: o Jesus Seminar", de Luigi Schiavo.
A pesquisa sobre o Jesus Histórico, a partir de Reimarus, no séc. XVIII, se desenvolveu, até os nossos dias, em três ondas, preocupadas em reconstruir os fatos históricos e a pessoa humana de Jesus, que ficavam como que escondidos atrás das afirmações dogmáticas e de fé das Igrejas. Tal busca é fruto de uma mentalidade racionalística, que acreditava, em nome da razão, poder reconstruir a verdade histórica relacionada a Jesus. Ela foi marcada por vários momentos e etapas, como a descoberta da estratificação e fragmentação dos textos bíblicos, sua consequente classificação, a inserção de Jesus no contexto histórico-sociocultural do judaísmo do I séc., e a referência a outras fontes canônicas, apócrifas e pseudepigráficas que lançavam novas luzes sobre a complexidade da religião e da sociedade judaica do tempo de Jesus.
Sendo os olhos e os enfoques do pesquisador bem diferentes dos olhos dos crentes e das Igrejas, são possíveis várias abordagem a Jesus, resumíveis a quatro:
O Jesus real: é o homem Jesus de Nazaré, o Jesus da história, que viveu na Galiléia na primeira metade do I séc. Pelo que podemos reconstruir, era filho de José o carpinteiro e de Maria, e tinha provavelmente outros irmãos chamados Tiago, José, Simão e Judas (Mt 13,55). Deve ter sido discípulo de João Batista e, depois da morte dele, atuou três anos como rabi, sendo condenado e crucificado, talvez na Páscoa do ano 30. Se de um lado conhecemos bem os dados relativos ao final de sua vida, sua infância e juventude são envolvidas no mistério, e as narrativas de que dispomos não passam de relatos míticos. Não temos fontes diretas sobre o Jesus real, mas só memórias literárias, sujeitas às limitações próprias destes documentos.
O Jesus histórico: é a reconstrução da figura de Jesus a partir dos dados a nossa disposição, vindo de várias fontes: a literatura bíblica e extra-bíblica do I séc.; a arqueologia; a sociologia; a historiografia, etc. Este trabalho, servindo-se de vários métodos científicos, busca reconstruir e entender o contexto histórico, sociológico e religioso do tempo de Jesus, tentando entender e imaginar o impacto de sua pessoa e mensagem dentro deste mesmo contexto. Parte-se do pressuposto que Jesus deve ser lido dentro do contexto galiláico de sua época. Não sabemos se o Jesus histórico corresponda ao Jesus real: com certeza se aproxima bastante a ele.
O Jesus teológico: é o Jesus das afirmações dogmáticas da Igreja, sobretudo dos primeiros quatro concílios que definiram os elementos fundamentais da cristologia, diante da fragmentação e do pluralismo das definições e dos movimentos religiosos: Nicéia (325), Constantinopla (381), Éfeso (431), Calcedônia (451). É o Jesus da fé, diferente do Jesus real, mesmo que tenha elementos do Jesus histórico, e que será a base da unidade da fé das Igrejas que a ele se referem.
O Jesus da fé: é o Jesus crido, na resposta de fé do fiel que encontra o Jesus da história. É o Jesus considerado o Filho de Deus, o Senhor da história, o Salvador, o Messias, etc. Neste nível, o Jesus real, como ele era, o contexto em que vivia, o que realmente disse e fez, tem menor importância. Vale o Jesus imaginado, representado, sonhado, na maioria das vezes relacionado com os próprios desejos e necessidades. É um Jesus que já se transformou num verdadeiro símbolo, mas que tem o poder de orientar a vida e se tornar a referência ética fundamental de grupos e pessoas.
17/02/2021
O Jesus Histórico (John Dominic Crossan)
Polêmicas em torno da verdadeira história de Jesus ganham a imprensa e os canais de TV a cabo desde 1985, quando começou, nos EUA, o Seminário Jesus, uma série de estudos idealizada por um ex-padre: o historiador John Dominic Crossan.
Professor emérito da Universidade DePaul, de Chicago (EUA), e autor de 24 livros sobre o Jesus histórico, Crossan é um dos maiores especialistas no mundo em estudar o Novo Testamento com olhar de historiador. Baseando-se em diversas ciências – história, teologia e arqueologia bíblica – ele trata os Evangelhos e documentos da época com o mesmo nível de importância: fontes históricas que precisam ser analisadas e contextualizadas pela ciência.
Em uma entrevista na Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde participou de uma versão brasileira do seminário que criou, Crossan manteve o jeito de padre ao falar de assuntos que tanto incomodam a Igreja sem prejudicar sua fé cristã. “Nosso esforço é o de separar o que, nos textos bíblicos, é fato histórico e o que é parábola religiosa”, afirma.
O que podemos afirmar de concreto sobre a vida de Jesus?
Primeiro, que ele existiu. Sabemos disso por meio de fontes romanas, judaicas e cristãs. Em segundo lugar, que ele foi mesmo crucificado pelo governador romano, legalmente, publicamente e oficialmente. Essa certeza de que ele existiu e foi condenado nos oferece muitas informações. Se foi crucificado, é porque era publicamente subversivo às ordens romanas e fazia parte das classes mais baixas da sociedade. Não era um pregador violento, já que Pilatos não se preocupou em persegui-lo, como fez com os companheiros de Jesus, e, sim, em crucificá-lo. Em resumo, Jesus foi uma pessoa que resistiu ao imperialismo romano de forma não violenta em nome do Deus judaico.
E o que não podemos afirmar sobre ele?
Se as parábolas sobre Jesus fossem tomadas literalmente, nós teríamos sérios erros. Há vários fatos acerca da genealogia, concepção, nascimento e vida de Jesus contados de forma diferente pelos evangelhos do Novo Testamento. Um exemplo: em Mateus, um anjo aparece para José falando sobre o nascimento de Jesus. Já em Lucas, o anjo aparece para Maria. Esses dois evangelhos têm aberturas parabólicas: as histórias que contam a infância de Jesus não devem ser entendidas ao pé da letra. Dizer que Herodes matou as crianças em Belém para matar Jesus, como está em Mateus, é uma parábola. É afirmar que ele é o novo Moisés e Herodes é o novo faraó do Antigo Testamento.
E o que se sabe sobre a morte de Jesus?
Foi uma ação coordenada entre a nobreza sacerdotal que estava ligada ao imperialismo romano. Foram os religiosos conservadores locais que colaboraram com o poder romano. Jesus se opôs à união entre uma religião conservadora e a violência do império. Da mesma forma, alguns fariseus e seus estudantes foram martirizados por tentar, de forma não violenta, remover a águia dourada (símbolo do imperador)que estava sobre a entrada do templo. Esse ato mostra uma aproximação entre Jesus e os fariseus, que não eram a favor do domínio romano.
Muitos religiosos afirmam que a importância de Jesus é o seu impacto cultural, e não quem ele realmente foi. Qual é então a necessidade de estudar o Jesus histórico?
O cristianismo sempre se considerou uma religião histórica. Trata-se de uma interação entre história e fé. Você estuda Jesus, historicamente falando, como estudaria qualquer outro objeto histórico. Se você é um religioso cristão, o que lhe interessa é o fato de ele se apresentar como Deus. No entanto, se você privilegia o elemento histórico da vida de Jesus, a sua análise não passa pelo campo da da fé, mas pelo da história, o seu olhar é o de Pilatos. Neste caso, vai interessar entender o porquê de ele ter sido crucificado. A escolha é sua.
Por que há resistência, por parte dos religiosos e dos acadêmicos, de estudar o Jesus da história?
Porque eles se recusam a aceitar o diálogo necessário entre história e fé. Existem muitos clérigos querendo fazer julgamentos históricos por meio da fé. Mas julgamentos assim são impossíveis. Para a história, o importante é o significado dos fatos. Cada religião faz reivindicações históricas. Mas cada doutrina precisa admitir que fé e religião são uma coisa, história é outra.