A união ecumênica e
renovação da igreja é uma coisa pela qual eu sempre tive muito apreço, e foi
também um dos propósitos do meu livro sobre a igreja. Nos campos de
prisioneiros de guerra, a única coisa importante era se a pessoa era um cristão
ou não, independentemente da denominação. A comunhão ecumênica das diferentes
igrejas não avançará se for mantida nos níveis superficiais de uma comparação
entre doutrinas e formas de organização; ela só terá sucesso se cada igreja se
voltar para a sua fundação e investigar as suas profundezas. É por isso que foi
dito o seguinte na conferência de Lund em 1962: 'À medida que buscamos nos
aproximar de Cristo, chegamos mais perto uns dos outros.' Eu levei isso um
passo adiante e disse: 'Sob a cruz, todos nós ficamos de mãos vazias. Nós não
temos nada para oferecer além do fardo de nossa culpa e o vazio de nossos
corações. Não estamos sob a cruz como Protestantes, Católicos ou Ortodoxos.
Pelo contrário, debaixo da cruz é onde os ímpios são justificados, os inimigos
são reconciliados, os prisioneiros são libertados, os pobres são enriquecidos e
os tristes são repletos de esperança. Descobrimos-nos, portanto, sob a cruz,
como filhos da mesma liberdade de Cristo e como amigos na mesma comunhão do
Espírito.
Eu não quis dizer isso
apenas no sentido espiritual, mas, especificamente, com referência à comunhão
da mesa de Cristo, que alguns cristãos chamam de Eucaristia, e outros de Ceia
do Senhor. 'O convite para a refeição eucarística é o acolhedor pedido do
Cristo moribundo que estava para se entregar por todos nós... Suas mãos
acolhedoras se abrem acima da refeição eucarística da mesma forma com que seus
braços estão estendidos sobre a cruz... Não vejo razão para que qualquer igreja
retenha as mãos abertas de Cristo, que estão estendidas para todos. Acho que
não há razão para recusar a Comunhão Eucarística a qualquer pessoa que ouve e
responde ao convite do Crucificado.' Depois de nos sentar juntamente com Cristo
em sua mesa, as diferenças da dogmática e do direito canônico podem ser
resolvidas, porque, depois disso, precisam ser resolvidas. Em 16 de outubro de
1975, eu proferi essas palavras na Universidade Lateranense, em Roma, na
presença do Cardeal Willebrand e, durante minha palestra, recebi aplausos
espontâneos do meu público católico. A réplica posterior do cardeal foi um
pouco forçada e requintada.
Mais tarde, mantive a
minha opinião com cada vez mais convicção. Primeiro vem a prática da celebração
partilhada da refeição de Cristo — em seguida, vem a teoria teológica e a discussão
sobre a doutrina da Ceia do Senhor. Pois, nessa refeição, estamos celebrando a
presença de Cristo não a correção de nossa teologia eucarística. O lugar para
discussão teológica ecumênica é a mesa depois da Ceia, não de antemão, fora dos
portões. Na minha opinião, dizer que uma celebração eucarística compartilhada
deve ocorrer somente quando o objetivo da unificação ecumênica das igrejas
tiver acontecido não está de acordo com o convite de Cristo: pessoas morrerão
de fome no meio do caminho. Naquela época, criei uma regra para mim mesmo:
participar da Ceia de Cristo sempre e em todo lugar que eu ouvir as suas
palavras de instituição e o seu convite, independentemente de qual seja a
igreja. Mas espero que a comunhão seja dada em pão e vinho, em conformidade com
a vontade e a promessa de Jesus, e que ela seja dada não apenas para os
sacerdotes, mas igualmente para os leigos também — ou seja, para todo o povo de
Deus. Considero a prática Católica de separação como algo não cristão. Minha
esperança ecumênica é que, com seu convite para a sua refeição, Cristo
prevaleça em todas as igrejas, para que a cristandade dividida possa reconhecer
a sua unidade nele e superar as suas divisões.
Fonte: Jürgen Moltmann, A Broad Place, SCM Press,
2007, pp. 208-10.
Tradução: Renan Rovaris