30/08/2018

O Abraço Ecumênico de Cristo


No interior da Catedral de Altenberg, Alemanha, existe uma escultura chamada "Amplexus" (abraço, em latim), feita por Werner Franzen. Nela, Jesus é retratado inclinando-se para a frente da cruz, abraçando Martinho Lutero, o reformador protestante alemão, e Bernardo de Claraval, o famoso abade católico francês conhecido  por combater os hereges. Segundo Jürgen Moltmann, a mensagem transmitida pelo artista é clara: debaixo da cruz de Cristo, as divisões denominacionais do cristianismo acabam.

Nós, protestantes, por diversas razões, temos uma atitude um tanto quanto fechada e partidária quando afirmamos quem são ou não nossos irmãos. Isso não nos ajuda a compreender a amplitude da igreja invisível. Precisamos lembrar que a igreja não começou com Calvino, nem com Westminster ou Dort. Talvez não seja necessário levantar as armas logo que ouvimos a palavra ecumenismo cristão. Afinal, o protestantismo sempre falou que a igreja invisível é invisível justamente porque não pode ser vista por meio de coisas externas.

Santo Agostinho acreditava que o batismo perdoava pecados, era alegorista na sua interpretação bíblica, falava favoravelmente sobre a oração aos mortos e, com seu misticismo cristão, não era nem um pouquinho cessacionista. No final das contas, era mais católico do que protestante. No entanto, para muitos protestantes, principalmente reformados, Agostinho é tido como um exemplo de Cristão. Por que aceitamos Agostinho, mesmo com as coisas que não concordamos, e não podemos enxergar os católicos através de uma perspectiva mais ecumênica? Talvez pudéssemos olhar para eles como irmãos que não têm uma teologia exatamente como a nossa, sabendo que isso não os impede de serem cristãos verdadeiros. Afinal, a salvação é somente pela fé em Cristo ou também pela exatidão teológica? Se for pela fé, não pode ser pela teologia exata. Se for pela exatidão teológica, não pode ser somente pela fé, e qualquer pessoa que acredita em uma doutrina errada estará fadada à condenação eterna. Falamos que a inexatidão teológica dos pentecostais não os impede de serem cristãos verdadeiros, ao mesmo tempo em que afirmamos que a inexatidão teológica dos católicos torna-os incrédulos. Parece que estamos usando dois pesos e duas medidas.

A unidade ecumênica das várias igrejas cristãs pode se tornar algo menos doloroso quando a busca por união parte do passado em comum de todas as tradições. A busca por unidade não deve começar pelas diferenças do presente, mas pelas semelhanças do passado. Só depois disso é que nos movemos para as ramificações das várias tradições ao longo da história. Trata-se de uma visão em retrospectiva, retraçar a história de cada tradição e chegar a um ponto de partida em comum. Quando cada tradição traça o caminho de volta para as suas origens, encontra, nessa origem, a revelação de Deus em Jesus Cristo, que é algo em comum para todas as tradições. Quanto mais nos aproximamos de Cristo, mais nos aproximamos uns dos outros.

As diferenças teológicas existem, e não creio que possam ser conciliadas de modo a desfazer o cisma de 1517. Não precisamos largar nossas convicções teológicas em nome do relativismo. Contudo, apesar de nossas convicções e diferenças, podemos entender que a obra de Cristo é muito mais abrangente do que imaginamos. Se olharmos para as nossas origens, veremos que todos cremos em Cristo, mesmo com diferentes interpretações de como a obra vicária é aplicada aos pecadores. Se percebermos que estamos, sob a mesma cruz, sendo abraçados por Cristo, talvez possamos abaixar as armas teológicas e nos reconhecer mutuamente como cristãos.