Nota: trecho retirado do livro Beginning from Jerusalem, de James D. G. Dunn, p. 579.
A confissão de Jesus como Senhor trazia consigo a implicação de que Paulo adorava Jesus como Deus e esperava que seus convertidos também o fizessem? A pergunta é mais complexa do que pode ser respondido com um simples Sim ou Não. Certamente, Paulo não hesitou em usar textos que falavam de Javé para se referir a Jesus; podemos notar particularmente o uso do fortemente monoteísta Isaías 45:23 no reconhecimento universal antecipado do senhorio de Cristo (Filipenses 2:11), e a maneira notável como Paulo parece incorporar Cristo dentro do Shemá de Israel (Deuteronômio 6:4) em 1 Coríntios. 8:6. O que não está claro, no entanto, é até onde Paulo concebia que o Jesus exaltado compartilhava a divindade de Deus em vez de simplesmente (!) compartilhar o (exercício de) senhorio. Sua conversa bastante frequente de Deus como "o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo" é igualmente notável, assim como sua elaboração mais explícita da relação entre Deus e o Cristo exaltado em 1 Coríntios 15:24–28. É certamente verdade que Paulo descreveu os cristãos como 'aqueles que invocam o nome do Senhor' (1Co 1:2), invocaram a Cristo (1Co 16:22), suplicaram sua ajuda na oração (2Co 12:8) e que ele não hesitou em ligar Deus Pai e o Senhor Jesus Cristo nas suas bênçãos em suas cartas. Mas também é verdade que Paulo nunca dirige sua oração de agradecimento (eucharisteō, eucharistia) ou suas petições normais (deomai, deēsis) a Cristo; ele nunca 'glorifica (doxazō)' Cristo, cultualmente 'serve (latreuō, latreia)' a Cristo, ou 'adora (proskyneō)' Cristo. Mais típico é que seus agradecimentos e orações sejam oferecidos 'por meio' de Cristo a Deus. Igualmente significativo, dado que toda a sua missão estava sob constante crítica de judeus crentes mais tradicionalistas, é que nunca há qualquer indício de que tais judeus encontraram qualquer motivo para crítica na cristologia de Paulo sobre o senhorio de Jesus, isto é, não vemos judeus criticando Paulo porque o ensino dele era considerado uma violação à unidade de Deus e do direito de ser adorado que só Deus tinha. Visto que a hostilidade judaica à atitude de Paulo para com a lei, embora refletida pelos crentes judeus, é tão clara, é estranho imaginar que tenha existido uma objeção mais séria à sua cristologia (além daquela implícita em 1 Coríntios 1:23 e Gal. 3:13) que não foi refletida de uma forma equivalente a 1 Coríntios 1:23.